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Em proposta de mudanças na previdência destinadas a  atingir a nova geração de trabalhadores e fundadas em um modelo híbrido, que combina benefícios não contributivos (universais) com contribuições (privadas) individuais, os professores Márcio Holland e Tomás Málaga,  da Fundação Getúlio Vargas (FGV-EESP) escrevem artigo no VALOR ECONÔMICO em que defendem que    correções futuras nos parâmetros possam ser realizadas por meio de lei ordinária.  

Em segundo lugar, propõem que se crie contas virtuais individuais, atualizadas periodicamente, tornando transparente a relação entre benefícios e contribuições. Acreditam ser  preciso promover aperfeiçoamento na governança das previdências complementares, especialmente a de servidores públicos e a de empresas estatais. É pilar de sua proposta que a previdência complementar tenha gestão transparente, valorize o patrimônio dos segurados e seja imune a abusos políticos.

O sistema de previdência complementar privado também precisará se alinhar aos novos tempos, com abertura deste mercado a players internacionais; a alocação dos recursos destes fundos deve visar o alongamento de ativos e passivos; e, por fim, vale considerar a criação de uma agência reguladora independente. No modelo que propomos, teríamos, primeiro, como propõe a Fipe, a instituição de Renda Básica do Idoso (RBI), não contributivo, universal, em substituição à Loas/BPC. Como existem atualmente 18 milhões de idosos, um benefício de meio salário mínimo, por exemplo, representaria 1,4% do PIB de gasto. Para manter essa mesma proporção no tempo, o PIB teria que crescer 2,7% ao ano até 2060, mantido o salário mínimo constante em termos reais e aumento do número de idosos para cinquenta e oito milhões, em 2060, conforme projeções do IBGE.

Os gastos com o Loas/BPC estão em 0,8% do PIB. Como esse benefício deveria ser substituído pelo RBI, haveria uma compensação fiscal natural. Segundo, ainda em linha com a Fipe, teríamos o Benefício do Regime de Repartição (BRR), público, contributivo, por repartição. Esse benefício seria fixado com teto menor do que o atual, algo como R$ 3 mil. Terceiro, tem-se o Benefício do Regime de Capitalização (BRC), privado ou público e individuais. São planos complementares de livre escolha e contribuição; porém, com alíquota mínima compulsória.

De modo diferente do visto até aqui, propõem a instituição de Seguro de Renda (SR), agregando outros benefícios, além do previdenciário propriamente dito, como Auxílio-Doença, Salário-Maternidade, Salário-Família, Auxílio Acidente, Auxílio Reclusão, etc. A lógica é que não cabe no mesmo sistema previdenciário riscos atuariais tão distintos. É um benefício que poderia continuar a ser oferecido pelo sistema público, como atualmente, mas com alíquota apartada daquela de contribuição previdenciária.

 Notam os professores que qualquer proposta de reforma da previdência que destoa do modelo vigente de repartição logo é alvo de críticas por conta de seu elevado impacto fiscal de curto prazo. Para tentar dimensionar o problema da transição, realizaram projeções preliminares. Em 2016, existiam 67 milhões de contribuintes ao RGPS (Regime Geral da Previdência Social) e 19 milhões de aposentados. Esse contingente continuará alimentando uma quantidade crescente de aposentados até pelo menos 2056, alcançando 28 milhões naquele ano. Isto significa um fluxo importante de recursos que terá que ser financiado com uma população declinante de contribuintes, uma vez que os jovens seriam dirigidos para o novo sistema. Os contribuintes para o regime atual cairiam rapidamente de 64 milhões para apenas 16 milhões em 2056, tornando o regime insustentável. O déficit somente das aposentadorias, sem contar auxílios, pensões etc. alcançaria R$ 461 bilhões, em 2060, a preço de 2016. Como o novo sistema é híbrido, parte da contribuição dos entrantes vai para o sistema de repartição, assim o déficit total do segmento de repartição novo diminui para R$ 259 bilhões. O regime híbrido, além de oferecer um mínimo de diluição de risco entre gerações, tem a vantagem de evitar que a população de contribuintes para o sistema de repartição caia rapidamente, ajudando na transição.

 As simulações feitas pelos professores mostram que, em 2060, o número de aposentados seria da mesma ordem que o número de contribuintes remanescentes no sistema de repartição. Porém, como o novo sistema mantém o pilar de repartição, haveria mais de 80 milhões de contribuintes. Contudo, as contribuições seriam insuficientes para cobrir o déficit do sistema de repartição no pilar de repartição. O problema decorre do fato de estarmos assumindo que as contribuições individuais, no novo sistema, seriam apenas da ordem de 50% da contribuição de 2016 para o pilar de repartição. O Tesouro teria que cobrir este déficit, emitindo dívida, o que tem o custo dos juros. No entanto, a porção de capitalização cumpre papel importante no equilíbrio do novo regime visto que os participantes investiriam em ativos financeiros de longo prazo, como títulos de governo. Em 2060, haveria uma demanda anual de pelo menos R$ 200 bilhões por títulos públicos ao ano proveniente do sistema de capitalização.

E concluem que esse exercício permite observar que, se por um lado  a migração imediata do atual sistema de repartição para um sistema de capitalização pura teria impacto fiscal muito elevado, por outro lado aquela feita para um modelo híbrido, como propõe, tende a tornar o sistema previdenciários brasileiro bem mais confiável dada a dinâmica demográfica e tecnológica em curso.

Fonte: Valor